segunda-feira, 19 de novembro de 2012

CONSCIÊNCIA NÃO TEM COR

Cantor Agnaldo Timóteo

“Eu só descobri que eu era negro quando comecei a frequentar a alta sociedade”. Essa frase foi dita pelo cantor Agnaldo Timóteo numa entrevista conduzida por mim para um programa de rádio, exatamente no dia da Consciência Negra. Ele foi escolhido para falar sobre o assunto pelo seu histórico de vida: um menino negro, pobre, do interior de Minas Gerais que venceu na vida, segundo ele, com grande apoio da cantora Ângela Maria, de quem foi motorista. Futuramente ele se destacou por sua voz que o tornou famoso por interpretar canções românticas. 
 
“Foi duro para mim quando tive que conviver com a alta sociedade. Até em salões de cabeleireiro fui barrado por ser negro” – disse ele, lembrando que quando estava em seu grupo de amigos de infância, jamais pensou sobre que cor ele tinha. “Era tudo muito natural” – revelou. 


O amor não faz acepção de pessoas
A declaração de Timóteo me  fez  lembrar das reflexões que meu colega de rádio e chefe de jornalismo Fernando de Souza dizia ao microfone: “A criança não nasce racista. Os adultos racistas são os que ensinam as crianças a observarem a cor do coleguinha; para a criança não existe rico, nem pobre, mas nós, os adultos, fazemos distinção de pessoas pela classe social”. 

Na realidade, consciência foi o que Timóteo teve. Foi firme e perseverante em seu sonho, não se deixando abater, pois se para uns era discriminado, para outros era uma estrela. Durante a entrevista ele fez críticas sobre a maneira como o negro se comporta. “O próprio negro não tem orgulho de si mesmo. Quando algum se notabiliza, acaba namorando ou casando com uma loira, ao invés de notabilizar uma negra como ele”- enfatizou.  

O cantor ainda declarou que o negro não deve adotar a autopiedade como uma arma de defesa, ou posicionar-se como vítima. “É verdade que existe o preconceito e o racismo velado no Brasil, isso não se pode negar. Mas o negro precisa mostrar sua força, sua coragem, sua garra; precisa estudar, se valorizar”- sugeriu.
 
Ele acredita que enquanto houver esse sentimento no coração dos negros, eles continuarão sendo escravos de  si  mesmos, ao invés de conquistar respeito pela valorização pessoal.  
 
Faz tempo que a questão de política autoafirmativa para a defesa dos direitos dos negros é discutida, o que trouxe o que alguns consideram como avanço com respeito às cotas raciais para universidades e sua ascenção na escala social. Mas enquanto se discute “direito dos negros”, parece que a questão discriminatória passa a ter uma marca oficial. Na verdade, o que  se deve  defender é o direito dos cidadãos. 
 
Respeito ao ser humano. Isso faz a diferença.
 
Mas parece que no Brasil vivemos ainda numa sociedade carcomida pelo racismo. Dificilmente negros ganham destaque e notoriedade na política, e em outros segmentos sociais como programas de TV; até mesmo no campo religioso, dificilmente se vê um grande líder negro que ganhe notabilidade. Os que abrem espaço para os negros, não o fazem, em muitos casos como um ato de respeito ao ser humano, mas para ganhar simpatia dos defensores de seus direitos. É possível que a sociedade dominante não ofereça aos negros a chance de se orgulharem por sua capacidade, por sua vontade de vencer, a não ser por um mecanismo com o qual parece  deter ainda o domínio sobre eles. Ou seja, se conquista algo, é por uma política de defesa; é pela previsão punitiva aos que  os  discriminam. Isso talvez não seja motivo de grande orgulho, pois a conquista parece se realizar por um “favor”. É uma política contraditória, que acaba oficializando o racismo e o preconceito. 
 
Ao Senador Paulo Paim, autor do Estatuto da Igualdade Racial, perguntei durante uma entrevista: A Constituição diz que todos são iguais perante a Lei; a Declaração Universal dos Direitos Humanos diz que todos os homens nascem livres  e  iguais em dignidade e direitos.  Por  que foi  necessário a criação do Estatuto da Igualdade Racial?
 
“Exatamente por causa disso” – respondeu ele. “Todos  são  iguais. E o Estatuto é para garantir essa igualdade, pois a Constituição não prevê punição a quem não cumpre a regra; o Estatuto, sim” – explicou. 
 
Não basta a Declaração Universal dos Direitos Humanos prever que os direitos são iguais para todos. Foi necessário estabelecer punições para os que não tratam seus semelhantes com respeito. Essa é a sociedade na qual vivemos. Não basta a regra, diante do egoísmo, da vaidade, e o senso de autosuficiência de alguns. Estabelecer punição pela falta de respeito de uns para com os outros, não é motivo de orgulho, nem de comemoração. Isso só revela a baixeza daqueles que se deixam amarrar pela escravidão do racismo. Esses, sim, são os que precisam de libertação.

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