quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

VOLTAR ATRÁS? QUEM TEM CORAGEM?


Hoje ela se arrepende. Reconheceu que foi intransigente, inflexível, apesar de todos os problemas e responsabilidade do ex-marido. Ele era um homem trabalhador, porém muito egoísta e individualista em seus assuntos. Não abria mão de ficar sozinho quando chegava em casa. Mal dava atenção para os dois filhos pequenos, que muitas vezes vinham recebê-lo com alegria. Sua frieza em tratá-los causava-lhes grande frustração, pois esperavam uma reação mais agradável do pai. Era a mulher quem cuidava de tudo. Das crianças, do supermercado; das contas a pagar; o marido se recusava até ir à padaria para comprar o pão para o lanche. Mas assim ele foi criado. Quando era inquirido, dizia para a esposa que sua mãe o servia assim, e fazia de tudo para ele.
O desejo de voltar pode se perder
quando carregamos
sentimento de culpa. Adotar comportamento individualista
seria uma maneira de apaziguar a consciência
diante de decisões que nos prejudicaram,

Mas que de igual modo traz sofrimento.

 


O casamento foi se desgastando sob esse estresse emocional. Com dois filhos de 09 e 07 anos, ela decidiu tocar a vida sozinha. Foi assim que  pediu para passar uns tempos na casa de sua mãe até conseguir um trabalho e alugar uma casa para morar com os filhos. Os meninos começaram a estudar na parte da manhã em escola pública. à tarde, ficavam sob os cuidados da avó.

Ao conseguir emprego, a filha alugou uma casa, e levou os filhos. Juntando o dinheiro do trabalho dela e a pensão que o marido passou a dar aos meninos, dava para as despesas básicas, as vezes com muito aperto.

Mas, agora, sozinha com os filhos, começou a ter problemas por não ter com quem deixar os meninos. Sua mãe já era idosa, e ela não queria que sua mãe se desgastasse com os netos, numa fase tão desafiadora na educação das crianças. Diante da situação presente, ela começou a pensar na decisão que tomou.

Vivendo este drama, ela conseguiu parar para pensar o que poderia ter feito para salvar seu casamento. No fundo, ela sabia que dificilmente seu marido mudaria de atitude depois de tanto tempo de convivência. Aos fins de semana, longe do trabalho, sozinha com os dois filhos, não sabia o que fazer. Em todos os cantos da casa em que olhava, ela via que agora, estava sozinha. Era apenas ela para resolver tudo. Sentia necessidade de alguém por perto; sentia falta de proteção.  Diante dessa realidade, considerou que, mesmo com o marido em casa, nos tempos em que era casada - que não fazia praticamente nada para ajudar - pelo menos era alguém que poderia estar ali por perto,  e era o pai de seus filhos, com suas responsabilidades peculiares. E o pior que ela não imaginava os transtornos emocionais que teria ao encarar a vida sozinha com os filhos. Os olhares de discriminação e até mesmo de pena da vizinhança. As piadas hostis que ouvia quando passava com os filhos na rua do bairro eram sempre desagradáveis. Toda essa situação gerou-lhe uma ansiedade tão grande, que começou a atrapalhar sua vida no trabalho e no cuidado com os filhos.

Hoje ela revela:  “por mais difícil que seja um casamento, depois que alguém foi casado, é mais difícil é recomeçar a vida. O melhor é sempre tentar salvar a relação”. Ela considera que foi precipitada e se arrepende.
Quando percebem que não podem tudo,
a sensação de impotência, em muitos casos,
pode levar à depressão, pessoas que alimentam o orgulho. 


Ela não mudou de opinião a respeito do marido, mas, disse ter amadurecido para entender que seria possível adotar a tolerância, considerando que cada pessoa tem suas limitações e seus defeitos.  Avaliou, também,  que não é fácil recomeçar uma vida depois da experiência de um casamento, ainda mais quando se tem filhos. Há muita coisa envolvida. Não é algo que se descarta sem consequências materiais, físicas e emocionais. Os problemas nas relações humanas são sempre solucionáveis, quando um lado demonstra interesse e compreensão.

É verdade que hoje tentam passar a idéia moderna de relações descartáveis, práticas -, sob o argumento de que se nao der certo tem outra saída. Há até mesmo quem considere que casamento está fora de moda, e que cada um constrói suas relações do jeito mais prático para si mesmo. Mas, seja de um jeito ou de outro, quando o casamento foge de seu propósito ou princípio orientado pelo Criador, há sempre sofrimento. E cada sofrimento ganha a dimensão da importância que damos aos motivos pelos quais sofremos.  Mas, até neste ponto, cabe a passagem bíblica: “no que depender de vós, tende paz com todos”. Não existe a parte mais forte ou a mais frágil nas relações humanas, como se sugere. Quando há respeito, compreensão, solidariedade entre todos, cada um estará cumprindo seu papel e assumindo suas responsabilidades. 

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

NOVA CHANCE


Em todo fim de ano ele prometia à família que deixaria de beber. A bebida o estava prejudicando, tanto no trabalho, quanto em suas relações sociais. Essa promessa que fazia, tinha muito a ver com os constrangimentos que sentia.  Era uma promessa que expressava mais um desejo, do que sua possibilidade solitária de lutar contra o alcoolismo. No trabalho já estava passando por problemas por causa da bebida.  O patrão já havia dado várias chances para ele, por ser um bom profissional  e muito competente em seu quadro de funcionários. Ele parecia um escravo do alcoolismo.
Estender a mão em sinal de apoio
é grande alívio para quem precisa de ajuda. 

Ele chorava e  se lamentava porque não tinha forças para deixar a bebida.  Ele sempre prometia à família, mas não conseguia cumprir. A força de vontade dele, necessitava de ajuda externa, pois como dependente alcoólico, sua vontade não era suficiente.  Ele tinha consciência que sua vida estava sendo arruinada.

A situação tornou-se insustentável, quando ele sofreu uma convulsão alcoólica de tanto que havia bebido durante as festas de fim de ano.

Foi em 1996 que às pressas foi internado na emergência de um hospital público. Mas foi ali, no corredor da emergência, diante da família, que chegou um homem. Parecia um cristão. Dizia com palavras de conforto, que aquele problema não estava perdido. Aconselhou os familiares a  procurarem a clínica onde ele trabalhava. Segundo ele,  muitos em condições piores eram recuperados da bebida. Mas naquele momento, a família estava muito preocupada com o estado de saúde do rapaz, que acabara de entrar em coma alcoólico e  quase morreu.

A família descobriu depois, que o motivo de ele  ter se embriagado daquele jeito, era por que ele havia assinado aviso prévio da empresa onde trabalhava.

Quando há afinidade nos propósitos
as ações ganham reforço. 
Ao se recuperar, ele contou à família que não aguentava mais aquela vida - a família o incentivou a se internar numa clínica para se recuperar do alcoolismo. Mas a clínica cobrava uma taxa de manutenção mensal. A família não tinha condições urgentes para interná-lo. Mas cada um foi fazendo sua parte, juntava um pouco aqui, um pouco alí, e conseguiram o montante necessário. Foram 06 meses para passar pelo período de desintoxicação e tratamento. Agora ele parecia recuperado, com uma aparência melhor, saudável e muito  disposto. Ele foi orientado a não frequentar lugares onde tinha bebida e que nesse período era importante ele evitar toda e qualquer situação que o levasse à bebida.


E assim foi. Já se passaram 15 anos. Nunca mais ele pôs um gole de bebida na boca. A família o ajudou. E ele aceitou ajuda, sem ser criticado, ofendido ou discriminado. Ele  estava consciente do drama e do sofrimento que vivia.

Na vida, precisamos de chance, de uma nova oportunidade. Sozinho, as vezes torna-se difícil. Seja qual for o problema, é com o  compartilhar de nossos dramas, que encontramos refúgio e auxílio. Mais que receber uma chance, ele se permitiu uma nova oportunidade. Isso é possível a todos. A compreensão da família, o respeito quanto ao problema que o outro vive, a solidariedade e a amizade, são indispensáveis em toda e qualquer situação que comprometa a vida de alguém, que não conseguiria livrar-se de seus problemas sem encontrar apoio. 

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

BASTOU MUDAR, PARA MUDAR


Ele era um pai amorável. Um marido exemplar, carinhoso com a família; um bom amigo e companheiro. Para ele, sua família estava em primeiro lugar. Com seu senso provedor, não deixava faltar nada em casa. Seus filhos estudavam em escola da rede particular, uma das mais caras da cidade onde morava. Os meninos andavam sempre bem vestidos com roupas de grife; calçados caros.

A mentalidade consumista ganha espaço porque
torna-se algo comum. 
De certo modo, viviam uma vida confortável, diferentemente da maioria dos que moravam em seu bairro. Ele não era um homem rico, mas trabalhava duro para conseguir manter seu padrão de vida, por considerar que sua família merecia o melhor, desde o alimento ao vestuário; dos objetos de valor e apetrechos eletrônicos ao carro. Para obter tudo o que tinha, desdobrava-se em dois empregos; à noite, como professor universitário,  lecionava numa faculdade numa cidade vizinha. Mesmo dando o melhor conforto para os filhos - o que julgava importante para eles - sua presença  em casa com os meninos era rara. Mal via os filhos, que cresciam, se desenvolviam, com tantas novidades para compartilhar com o  pai, mas impedidos pelo distanciamento circunstancial.  O tempo era escasso para ele. Parecia viver correndo contra o relógio. Certa manhã, ao levantar-se cedo para o trabalho, como fazia todos os dias, sentiu forte dor no peito e foi levado ao hospital. Ele estava infartando. Internado por alguns dias, começou a refletir sobre sua vida. No leito do hospital não se desligava. Ao mesmo tempo em que se preocupava com seu trabalho,  fazia seus cálculos de quantos dias estava perdendo, furtando-se à presença da família devido a sua busca frenética por manter um padrão de vida que avaliou friamente não ser tão necessário; foi ali que ele pensou como ele poderia mudar. E foi alí, se recuperando,  que tomou uma decisão. Ele entendeu que sua família poderia consumir menos, sem passar necessidade; que seus filhos e esposa poderiam vestir-se bem, sem ter que usar roupas de marca tão caras por pura ostentação. Por algum tempo ao analisar sua vida e a maneira como estava se desgastando com tanto trabalho, pensou, também, sobre como as pessoas o veriam depois dessa mudança. Passou por sua cabeça pensamentos divididos, ao pensar no choque que seus amigos teriam ao perceber sua mudança no padrão de vida. Mas reconsiderou que mudaria por uma boa causa. Mudaria por sua família, por sua saúde. Era necessário. Foi assim que ele decidiu deixar um dos empregos, o que fez diminuir sua renda.
Algum dia, descobriremos que as coisas
essenciais para a vida não tem preço. 


Os filhos passaram a estudar numa escola mais barata e, nem por isso tiveram mal desempenho. Aprenderam a desperdiçar menos; a esperar menos e a valorizar mais as aquisições. Experimentaram, na prática a viver uma vida modesta e com mais qualidade. O que tinham era essencialmente o necessário.

Os gastos com o supérfluo foram regredindo. A família estava mais unida agora. Ele pasou a ter mais tempo com os filhos e experimentou coisas que nem imaginava. Gastar nos passeios, como faziam, já não era algo obrigatório. Aprenderam a passear no parque; admirar as paisagens, a conversar. Agora bem recuperado da saúde, ele olhou para trás e percebeu quanto tempo perdeu, vivendo uma vida escrava para dar satisfações à sociedade consumista na qual aprendeu viver.

O comportamento consumista tem consumido muitas famílias. Consumido a presença dos pais junto aos filhos; consumido a saúde física e mental. Consumido o tempo para uma boa conversa, o sentar-se à mesa para um jantar em família.

O comportamento consumista tem levado famílias à falência, por um apelo quase que coletivo de que devemos parecer para ser; ostentar para sermos vistos, não importa o quanto isso venha custar no futuro. Ao avaliar nossa vida e nossas condições, perceberemos que podemos consumir menos, comprar menos, desperdiçar menos.
Há outras maneiras não convencionais
que promovem momentos felizes. 


Ao colocarmos na balança as decisões que pretendemos tomar, é preciso avaliar o que de positivo poderá nos restar. Muitos deixam de mudar, reduzir, diminuir, pelo simples fato de não querer passar uma imagem que poedria ser interpretada como de fracasso, de perda, segundo o olhar daqueles que estão de fora, que dificilmente sente na pele o sacrifício do outro na tentativa de dar resposta ao  que os outros esperam.

Mas não há nada que compense uma vida com mais qualidade. Muitas vezes, o orgulho faz com que permaneçamos do mesmo jeito por fora, mantendo as aparências e os padrões dentro dos conceitos dominantes, mas carcomidos por dentro, o que pode levar à ruína em questão de tempo.
A humildade para reconhecer que precisamos mudar, nos trará de volta a liberdade e o controle de nossa vida. Neste caso, a humildade que nos faz reconhecer a necessidade de mudança pode se tornar o princípio da regeneração.

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

ELE FICOU RICO E REVELOU-SE POBRE


Ele cresceu num lugar pobre. Quem via aquele menino, talentoso e dedicado aos estudos, mesmo vivendo em condições precárias, dizia que ele nasceu no lugar errado.
Muitos diziam a seus pais, que ele precisava estudar numa melhor escola; relacionar-se com pessoas de mais influência para poder desenvolver-se e tornar-se “alguém” na vida. Seus pais não entendiam muito bem essas coisas. O pai era um lavrador. Cuidava de um sítio. Sua mãe, do lar, mal sabia ler e escrever. Mas o menino crescia alí, naquele lugar simples, sem muita estrutura.

Mesmo em meio a pessoas consideradas sem influência e estudante de  escola pública, o agora adolescente tornava-se o centro das atenções, tanto por suas habilidades nos estudos, quanto por sua veia artística. Ninguém sabia explicar como ele se desenvolvia daquela maneira. Ele cantava, desenhava, tocava instrumentos musicais, era nota dez em quase todas as matérias. Alguns o consideravam um gênio.

Mas, nada disso era motivo de orgulho dos pais, nem motivo para receber tratamento especial. Eles encaravam isso de maneira tão natural, como se todas as crianças fossem como seu filho. Não procuravam compará-lo com outros meninos de sua idade, por isso não faziam distinção. Talvez pela simplicidade de seus pais em lidar com a vida – isso não era visto como um caso especial.  

Muitos não conseguem avançar na vida
sem virar as costas para
o que pode ser mais importante. 
O menino cresceu. E com o passar dos anos, começou a olhar para si mesmo e, percebia que era diferente dos rapazes de sua idade. Ele tinha várias habilidades, expressava-se bem, parecia ter um futuro brilhante pela frente. Mas, certo dia, começou a ver as condições de sua família. Olhava para seus pais e sentia vergonha deles, bem como da casa em que morava. Seus pais pareciam viver numa outra esfera, sem muitas reações sobre o que o filho era. O rapaz se sentia orgulhoso quando era mencionado, elogiado lá fora, aplaudido e tido como uma pessoa brilhante.  Mas, dentro de casa, não tinha essa profunda admiração que os outros tinham por ele.

Isso foi apontado futuramente como um motivo para afastá-lo dos pais. Assim, ele  procurou um lugar  que considerava melhor para viver. Procurou alçar vôos mais altos. Seus pais ficaram tristes em se separar do filho, do qual nem se despediu direito. De fato, esse menino parecia não fazer parte daquela família.

Com o passar dos anos, ele ignorou os pais definitivamente. Seu pai, já avançado em idade, castigado pelo trabalho de sol a sol, adoeceu. Agora, o único filho que havia deixado o lar, foi procurado pela mãe. Ele, agora, um homem formado, casado e bem sucedido na vida, ao ser avisado pelo porteiro da presença da mãe em seu prédio, recusou-se atendê-la. Ele chegou a dizer que não conhecia aquela mulher, de roupas simples e expressão sofrida, contrastante com o luxo da fachada do edifício onde o filho morava. Ela insistiu, mas em vão.

Foi assim, que muito abatida ela voltou para casa. Ao tomar  conhecimento da situação dela e do marido, seu vizinho, um rapaz órfão de pai e mãe, que trabalhava como vendedor ambulante, se propôs a ajudar aquele casal, desamparado pelo único filho. Aquele vendedor, vivia só, tinha suas economias, das quais tirou parte para ajudar na compra de remédios para seu vizinho.
Nossa mediocridade pode acentuar-se com mais
evidência quando alcançamos o poder


A vida é cheia de surpresas. Aquele que as vezes é visto como pobre, sem habilidades ou aptidões, pode possuir a maior riqueza do mundo. O sentimento de compaixão pelo próximo, talvez seja a grande riqueza que devemos cultivar. Por outro lado, os que orgulham-se por seus postos, que buscam aplausos e reconhecimento, podem viver a aridez de um coração frio e sem amor. Nenhuma riqueza ou capacidade humana pode superar a sensibilidade que nos leva a olhar para o nosso semelhante, como a nós mesmos.

Esse filho foi ingrato, mesmo sob a justificativa de não ter recebido elogios e atenção devida dos pais. Ele julgava merecer um tratamento  que seus pais não lhes dava.

De que vale nossas conquistas
se boas lembranças não deixarmos para
os que vem depois de nós? 
Esperar reconhecimento dos outros para dar-lhes alguma coisa em troca, é viver na mediocridade. Isso pode esconder, de fato, o que temos no coração, usando essas questões como um subterfúgio para não assumirmos que precisamos de humildade. Diante de todas as aptidões e inteligência que esse jovem possuía, a mais importante ele não cultivou: a caridade. 


Muitas vezes, é na riqueza que a nossa pobreza se acentua. Mas os sinais são percebidos na trajetória do caminho pela maneira como valorizamos as coisas. Se entendemos que só mesmo por conquistas materiais mostramos o nosso valor e nossa capacidade, assim julgaremos os outros. Se julgamos que as roupas, os bens e o status são elementos que nos valorizam, assim também julgaremos os outros. 

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

NOVA VIDA, VELHOS AMIGOS


No passado, ele tinha um histórico de pessoa complicada, de gênio difícil quando se tratava de opiniões pessoais. Era firme no que defendia e, até mesmo agressivo para defender suas opiniões. A verdade é que ele respeitava a opinião e posição dos outros, por isso opinava com respeito; mas irritava-se com facilidade, quando era contrariado. Queria ser tratado da maneira como tratava. Mas nem sempre era assim. Por outro lado  era uma pessoa querida, por ser amigo e ter um espírito solidário e colaborador. Era espontâneo quando percebia que alguém precisava de ajuda.
Mudar de vida não é isolar-se
das realidades indesejáveis
mas com um novo olhar,
vislumbrar um futuro promissor. 


Ele tornou-se evangélico; foi batizado numa igreja e, como membro atuante, com a mesma maneira espontânea e humana de lidar com as pessoas a quem amava, agia com seus irmãos na fé.  Mas sua conversão ao evangelho, não cortou vínculos com seus velhos amigos. Apesar de receber muitas críticas de alguns, que diziam ser muito arriscado ele continuar participando das mesmas coisas do passado, ele não dava ouvidos. Diante disso, ele até criava discussões acaloradas para defender seu comportamento, que para ele era correto.  Ele pensava que a religião não podia ser um pretexto para se afastar de pessoas que tem outras maneiras de pensar ou levar a vida, pelo contrário, o princípio da religião como dizia, era um meio de ajudar pessoas a se religarem a Deus.  Ele dizia aos críticos,  que  não  encontrava uma outra maneira de testemunhar aos velhos amigos, se não fosse pela amizade e pelas boas relações.  

Para ele, deixar de lado "o velho homem", não tinha relações com o exterior, mas com a transformação operada no coração.  Isso gerava polêmica com os tradicionais, e, assim, era observado, mesmo que à distância, por aqueles que ainda desconfiavam de sua verdadeira conversão ao evangelho.
Certa noite, ao caminhar para sua igreja passou em frente a uma roda de samba e, ali, estavam seus velhos amigos, quando um deles o chamou. O amigo parecia bêbado; falava com dificuldade, com uma pronúncia pesada, característica de quem está alcoolizado.  Estava com as roupas sujas, como quem já havia caído na calçada. Seu amigo evangélico parou, enquanto os batuques dos tambores continuavam, atrapalhando a conversa dos dois.

Mudança de vida,
nem sempre sugere
mudança de lugar. Mas de atitudes. 
Então, o amigo, alcoolizado, foi convidado a sair de perto do barulho para que pudesse ser ouvido. O outro estava ali, parado, na esquina, com trajes de igreja, com a Bíblia na mão, ouvindo um homem que estava sendo rejeitado pela família; um homem que entregou-se à bebida, por uma desilusão amorosa muitos anos antes, da qual não se recuperou.

Ali, na roda de samba, buscava o apoio da companhia de amigos, onde bebia, extravasava suas emoções com o cantarolar às vezes balbuceado, dos ritmos dançantes. Mas foi ali, conversando com o samba como trilha sonora, que disse ao amigo que não agüentava mais aquela vida. Que havia perdido o grande amor de sua vida e que precisava muito de ajuda para superar sua desilusão. Ele pediu oração ao velho amigo, pois dizia que ao ver sua mudança de vida, gostaria de ser como ele agora. Seu amigo, a caminho da igreja, ouvia atentamente, quando percebeu que estava atrasado para o culto. Mas, continuou ali mesmo, onde estava, ouvindo aquele jovem, já com aparência castigada pelo sofrimento e muitos anos como usuário de álcool. As faces pálidas e encovadas; com uma mente ao mesmo tempo perturbada, esforçava-se para ser compreendido.  Mas recebeu atenção e seu pedido foi atendido pelo amigo, que decidiu continuar junto aos seus velhos amigos, para mostrar-lhes que a solução existe.

 
Na verdade, muitas vezes pensamos que a conversão ao evangelho, é afastar-se de pessoas que consideramos más influências. Mas entre elas, há corações sedentos de vida, de esperança, de amor. Assim como fomos alcançados, poderemos ser instrumentos de Deus para ajudar ao aflito e  ao necessitado e, aos que, sem uma perspectiva de vida, tendem a fazer o que é mais conveniente diante de seus olhos. Quando aceitamos a salvação, também nos tornamos instrumentos de salvação para outras pessoas. Deus nos chama para servir, não os que já estão servidos, mas aos que ainda tem fome do pão que sacia para a eternidade. 

domingo, 19 de fevereiro de 2012

ERA UMA VEZ...UM CARNAVAL


Ele saía todos os anos numa das alas de sua escola de samba do coração. Era muito dedicado. Frequentar o barracão da escola de samba, era como que um ato religioso para ele. Colaborava com sua escola, ajudava na confecção de apetrechos e era sempre muito prestativo com os colegas. Era um homem muito sincero, espontâneo, de bom coração e sua maior felicidade era o dia do desfile. Para ele, era o dia que mais esperava todos os anos. Mas, foi exatamente numa noite de carnaval, que algo inesperado lhe aconteceu. Ele já estava vestido com sua fantasia quando apressadamente pegou seu carro na garagem, despediu-se da esposa e dos filhos, que preferiam assistir ao evento pela televisão. Quando dobrava a esquina, envolveu-se num acidente de carro, depois de avançar o sinal. Foi um acidente sem maior gravidade. No outro carro envolvido, desceu um homem de terno e gravata, parecia um pastor. O homem, com trajes contrastantes percebeu quando aquele homem se aproximava de seu carro. 
Para muitos a alegria é apenas fantasia. 

Ele bateu o peito ao volante; estava sentindo dor, quando aquele homem chegou até à janela de seu carro para dizer alguma coisa. O olhar dos dois se cruzou. Eles se reconheceram. Foram colegas de escola no curso ginasial. Foi uma surpresa para ambos. O ex-colega, agora pastor, demonstrou felicidade, relembrando que o amigo seguiu o caminho que todos já imaginavam. Desde os tempos de escola, não escondia sua paixão pelo carnaval, enquanto o folião perguntou-lhe se ainda era crente. E, falando sobre sua vida, disse que havia se formado pastor num curso teológico e que, naquele momento, dirigia-se à sua igreja, quando o acidente ocorreu. O pastor tratou de buscar socorro para seu amigo, que depois de ser avaliado pelo médico de um posto de saúde, foi liberado. Ele, com aquela fantasia, acompanhado de um pastor - mas foi naqueles poucos momentos que passaram juntos, que trocaram telefones e, o pastor o chamou para almoçar em sua casa no próximo fim de semana.

Foi nesse reencontro que os dois velhos amigos partilharam de suas experiências. O folião foi convidado a ir à igreja e, num momento especial de pregação sobre a Salvação em Cristo, ele foi tocado. Na verdade, aparentemente este homem mostrava uma alegria que no fundo não existia. O carnaval era sua grande paixão, mas não preenchia o seu coração. Ao acabar os desfiles ele caia em profunda depressão; bebia para tentar prolongar o prazer que sentia nos momentos em que brilhava na avenida. A pregação daquela noite o levou a refletir o que nunca tinha pensado: o pastor dizia que "a vida não se resume apenas em momentos. Os momentos passam; a euforia acaba; é como se bebêssemos uma água que não sacia a sede; o mesmo que comêssemos uma comida que não sacia a fome. E, do nosso jeito, buscamos um motivo para viver. Mas o grande motivo do viver é o que permanece conosco, mesmo depois do apagar das luzes quando uma festa se acaba. É algo maravilhoso e inexplicável que permanece no coração, trazendo a sensação de uma alegria que não depende apenas das coisas que estão do lado de fora, mas o que vem de Deus e enche a nossa vida".
Jesus age de maneira surpreendente
para alcançar
pessoas
Aquele homem prestava atenção a cada palavra que ouvia, como se estivesse aproveitando e assimilando cada frase, cada expressão. E o pastor dizia finalmente: "Jesus veio a este mundo para que todos tenhamos vida em abundância. Vida feliz; vida com motivo real; uma vida que não se apaga junto com o apagar das luzes deste mundo".  

Ao final do culto, o aquele folião desejou conhecer mais sobre a palavra que o pastor pregou naquela noite. Ele entendeu que não foram palavras vazias; sentiu que precisava encontrar a motivação da qual o pastor falava. Foi assim, que a partir daquele noite, em seu coração, decidiu levar uma vida diferente. Tornou-se um cristão; abandonou sua grande paixão; deixou para trás uma história de 20 anos com a folia, para seguir o caminho da eternidade.

De várias maneiras, Deus nos alcança. Há os que são alcançados de forma inusitada; até mesmo em lugares ou em situações que menos imaginamos. Isso é prova segura de que Deus continua a se importar conosco, independentemente das circunstâncias. O plano de Deus é único para todos, mas Ele age de maneira individualizada para alcançar aquele a quem ama e deseja proteger dos enganos deste mundo.

sábado, 18 de fevereiro de 2012

E QUANDO O CARNAVAL PASSAR?


Buscar o Senhor enquanto se pode achar e
invocá-lo enquanto está perto
deve ser comportamento diário. 

O  período de carnaval exerce grande interferência na  vida das pessoas, até mesmo em relação aos crentes. É comum o esvaziamento dos templos em que muitos se retiram para passar os momentos do feriadão fora das grandes cidades, para, de alguma maneira,  fugir das agitações que essa festa popular sugere. É comum, também, o planejamento para essas viagens que mesmo sob a justificativa de fugir do carnaval e dos barulhos e incômodos que provoca, nem sempre o tempo é utilizado mesmo para a meditação, a reflexão sobre as condições espirituais que o mundo atravessa, até mesmo em questões pessoais diante de nossos comportamentos e decisões na vida.

Em épocas como páscoa em que os cristãos exaltam o cordeiro de Deus, em vez do coelhinho da páscoa e seus ovos de chocolate; como no natal, em que aproveitando a data utilizamos para chamar a atenção para o verdadeiro sentido da data, no carnaval não é diferente. Os apelos são sempre os mesmos. Utilizamos o discurso de que “como nos dias de Noé” as pessoas estavam distraídas com as coisas da vida até que veio o dilúvio e a todos consumiu.  Não são apenas os divertimentos ou momentos de euforia que  levam-nos à distração. Hoje, as possibilidades para a distração são bem maiores, mas não importa a realidade. A distração passa a ser um estilo de vida e, esse estilo escraviza. Somos distraídos e absortos por aquilo que damos mais importância e vivemos em torno disso, até mesmo por causas que julgamos necessárias.  O caso de Maria e  Marta  e o  comportamento que adotaram diante de Jesus, nos traz à luz a essência da mensagem. Jesus não era um estranho entre elas.

É importante, sim, acentuar as mensagens de advertência ao mundo e levar pessoas à reflexão. Mas o que o nosso recolhimento pessoal pode significar para a vida daqueles que preferem se divertir no Carnaval? De que maneira esse recolhimento que fazemos  mostra, de fato, a nossa necessidade de uma aproximação com Deus?

Cada um pode fazer de seu momento
 de comunhão
um estilo de vida, mesmo longe dos templos. 


Aprendemos que o nosso momento de comunhão, reflexão e meditação precisa ser diário. E, se isso não ocorrer no nosso dia a dia, dificilmente poderá ocorrer num momento em que nos retiramos em grupo. Mesmo diante da programação elaborada para esse fim, é preciso que a mente esteja preparada para esse propósito, senão, de algum modo, o retiro será também um momento de divertimento e passatempo, mesmo diante de atrações que consideramos saudáveis dentro da proposta que defendemos; do mesmo modo como os que encontram na festa carnavalesca um motivo para se divertir, brincar entre amigos e realizar o que gostam dentro de sua realidade. Ou seja: nada de novo acontece: cada um na sua, buscando fazer o que sempre fizeram. E Deus e sua mensagem continua a mesma para todos. 

Talvez seja cômodo da parte dos que não compactuam com a “festa da carne”, adotar um pensamento crítico, mas não é isso que pode operar a mudança que necessita ser operada. Ainda que nos afastemos das grandes cidades e das agitações comuns, isso também não trará a mudança de vida buscamos, assim como somos orientados pela revelação Bíblica. Parecemos viver de certo modo, “orquestrados” pelo sistema secularizado cujas ações ativas e propositivas ocorrem por esses estímulos, que tem prazo de duração definido.  A vida “espiritual” não é robustecida por alimentos temporários como os compartilhados em palestras, exposições e testemunhos que ouvimos normalmente nesses encontros. Tudo tem sua validade, não necessariamente como algo que venha interferir numa mudança de vida. A questão vai além daquilo que ouvimos ou das sensações que temos diante de determinada mensagem ou exposições que impressionam em determinados momentos.

Assim como a festa da carne dura alguns dias, do mesmo modo o retiro “espiritual” tem seu período determinado. Assim como os carnavalescos voltam a sua vida normal após a folia, os retirantes espirituais também voltam à sua rotina após o feriadão. E a vida continua. Como? De que maneira? Assim como foi nos dias de Noé, tem sido em nossos dias. Isso é fato. Tanto para os que estão ajudando a construir a arca, quanto para os que debocham e caçoam da mensagem de diversas maneiras. Poderemos estar adotando o mesmo comportamento daqueles que continuavam sua vida normalmente e indiferentes com o compromisso que temos de ajudar a levar pessoas ao caminho da salvação. Preferimos viver em tribos, em células, compartilhando nossos pensamentos; nos   confortamos  pelo fato de termos encontrado a verdade; compartilhamos nossa literatura, nossas músicas entre o nosso grupo e continuamos  alheios. Nos  satisfazemos  em criticar aos de fora e, internamente, aplaudimo-nos uns aos outros; fazemos a nossa própria festa; produzimos a nossa própria comida; dançamos a nossa própria música.  

Hoje, como em qualquer outra época ou dia da semana,  precisamos nos despojar da nossa própria justiça e permitir que Jesus entre em nosso coração para realizar a mudança e operar a conversão. A conversão não é diária como pensamos. A perseverança, sim. E ela só é possível quando aceitamos definitivamente O Caminho, A Verdade e a Vida. De outra sorte, viveremos uma vida penitente em todos os momentos, apresentando-nos como miseráveis por reconhecer o nosso estado, deitando nas cinzas e nos vestindo com pano de saco, mas sem uma entrega real do coração, pedindo a Jesus o que ele já nos ofereceu; “buscando” uma verdade que já encontramos  mas não a praticamos.  Se assim ocorrer, seremos multiplicadores dessa mensagem, refletindo em nossa vida a ação do Espírito Santo e ajudando a outros encontrarem esse caminho, mesmo que necessitemos ir onde o pecador está.  
Precisamos adotar a missão de “pregar a tempo e fora de tempo” e não sermos motivados apenas como mensageiros reacionários, mas propositivos. Que não falemos apenas em momento oportuno, motivado por ações coletivas de grande repercussão, mas que a transformação de nossa vida seja contagiante em todas as situações.


quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

SOZINHO ELE NÃO CONSEGUIU

É preciso entender que nem tudo
obedece às nossas expectativas.
Ele era um homem de muitos talentos, boas idéias; tinha uma boa oratória e poder de persuasão que o colocava em destaque em tudo o que fazia. Formou-se numa importante universidade. Seu espírito empreendedor o levava para frente. Certa vez, um de seus trabalhadores o procurou para conversar e passar alguns projetos que tinha. Disse que precisava fazer algo novo em que pudesse desempenhar exatamente o que gostava. O patrão olhando para ele e, tentando motivá-lo, foi incisivo, dizendo que ele não deveria se preocupar tanto com o trabalho e que devia fazer algo diferente e, ainda, o aconselhou a   praticar esportes, atividades físicas, pois assim talvez,  pudesse sentir-se melhor.
Por outro lado, o patrão dizia que naquele momento não precisava de ajuda de ninguém e que conseguiu tudo o que conseguiu na vida porque não se deixou abater; correu atrás do que queria, nunca esteve desmotivado e orgulhava-se disso. Mas era um homem extravagante, impulsivo; tudo o que queria teria que ocorrer de maneira rápida; chegava a pressionar seus funcionários dizendo que o que queria era para ontem.

O empregado saiu de sua sala desapontado. Não era isso o que buscava, não era o que esperava. Mas continuou, mesmo sabendo que poderia ser mais produtivo e  melhor aproveitado e realizado profissionalmente.

Passados alguns anos, ele saiu da empresa e foi trabalhar com um empreendedor iniciante. Com sua experiência, aliada ao empreendedorismo do seu novo patrão, fez a empresa crescer e prosperar. Aos poucos, ele foi conquistando a confiança e credibilidade com a seriedade com que tratava seus negócios. Sua relação com os empregados da empresa era clara; sempre dizia o que realmente queria dizer e precisava ser dito; fazia o que realmente precisava ser feito, com transparência. Sua ambição não ultrapassava o bom senso; demonstrava ser um homem equilibrado e de valores morais bem definidos. Mesmo sem ser impulsivo e agressivo em suas ações, porém com trabalho permanente e projetos consistentes, tornou-se um homem próepsero, e não orgulhava-se disso. Parecia fazer tudo de maneira orquestrada, segura, como se soubesse exatamente onde chegaria.
Para ações definidas, há critérios definidos.
Certa vez, um funcionário o procurou. Disse a ele que futuramente gostaria de ser um empreendedor como ele. E perguntou-lhe  qual era  seu segredo de sucesso. Com muita humildade ele respondeu: -Você primeiramente precisa ouvir o seu coração; é o desejo do seu coração aliado à sua competência que o fará vislumbrar algo melhor. Mas esse sentimento jamais será compreendido por aqueles que não conseguem enxergar isso em você, e que você senta jamais lhe concederem oportunidade para que você coloque em prática o que realmente acredita. É melhor aliar-se com quem precisa de você, do que com os que cresceram de maneira que os levaram a sentirem-se grandes o suficiente a ponto de dizerem que não precisam de parcerias. Um outro segredo é crescer primeiro para baixo e criar raízes; depois crescer para os lados para ter estabilidade e, só depois, crescer para cima. Isso é no passo a passo. É como o semear uma semente. Não  planta-se hoje e colhe-se amanhã. A semente precisa estar em boa terra; ser regada e cuidada, para que seus frutos sejam saudáveis.

Separar proatividade, de atitudes precipitadas, é
questão decisiva para obter sólidos  resultados.

É verdade que na vida moderna somos motivados a fazer as coisas apressadamente, como se isso fosse trazer resultados mais rápidos. Aprendemos ser imediatistas. A sugestão é "movimento" e, que as coisas envelhecem da noite pro dia. Nem sempre as coisas acontecem como pensamos, mas acontecem como devem acontecer a seu tempo. É necessário o reconhecimento sobre o papel que temos a desempenhar para que os sonhos e projetos de vida se concretizem de maneira sustentável, honesta e segura. Senão, passaremos a vida plantando muito e colhendo pouco; gastando energias no presente, que precisaremos no futuro, para usufruir tudo aquilo que desejamos.

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

QUEM É QUEM


Era um menino ainda franzino e, quem o via trabalhar, sentia piedade; outros comentavam sobre sua coragem e disposição, não por que ele trabalhava, mas, pelo que fazia. Para um menino de 09 anos, ajudar descarregar o caminhão de verduras de seu José era trabalho pesado. Quem olhava de fora tinha opiniões diferentes. Uns comentavam, até com certa admiração, o fato de um menino tão pequeno fazer o que fazia, enquanto outros brincavam. Outros diziam ser um absurdo aquele menino carregar aqueles caixotes cheios de verduras. Mas o curioso era que o menino não era empregado de seu José. Ele fazia por que queria. E, assim era nas redondezas com a vizinhança. Diversas vezes encontrava-se com vizinhos que desciam do ônibus com sacolas de compras e se prontificava a ajudar levar o peso até em casa.

Ele não era um menino de rua. Morava ali mesmo no bairro. Tinha outros irmãos mais novos. Seus pais eram bons vizinhos e pessoas honestas, apesar de pobres e ter uma vida difícil. Gostavam e orgulhavam-se da maneira como seu filho ajudava as pessoas. Em casa era a mesma coisa. Sempre prestativo.

Mas ele decidiu trabalhar. Comprou uma caixa de isopor, e começou a vender picolé no centro da cidade onde morava, exatamente num momento muito difícil para seus pais. Seu irmão menor ficou doente e, os recursos da família, não eram suficientes. Apesar de pouco dinheiro obtido com a venda dos picolés, dava para ajudar em outras coisas - por exemplo, comprar pão e leite - algum alimento para casa, o que já ajudava.

Certo dia, ele chegou perto de um homem e ofereceu o picolé, dizendo: "Compra, moço; compra pra me ajudar; eu quero ser alguém na vida".

Erramos ao associar o que as pessoas fazem
ao que elas são.
Aquele menino, tão prestativo e de grande amor no coração pelas pessoas e pela família, pedia ajuda para ser alguém na vida. Dando atenção ao pedido do menino, ele o perguntou: "O que é ser alguém na vida? O que quer ser? O que você pensa que lhe faria alguém na vida?"
Talvez o menino não tivesse noção exata do que estava pedindo. Muitas vezes, até mesmo por vício de linguagem, alguns se manifestam dessa maneira, com o objetivo de sensibilizar aos outros para aquilo que oferecem, como no caso dessa criança, que oferecia seu picolé, sob o pretexto de que sua venda o ajudasse a ser “alguém” na vida.
Diante daquele homem, o menino disse apenas, que queria vender seu picolé. E aquele homem disse ao menino: - Todos nós, somos alguém na vida. Você é alguém. Insubstituível. Você é único; não há outro igual a você.


É fato que aprendemos a avaliar sobre o que vemos.
É necessário mudar o olhar para enxergar.  


A verdade, é que aprendemos que ser alguém, é ter uma profissão que nos dê estabilidade ou notoriedade; aprendemos que ser alguém é portar um diploma universitário; é alcançar status social; conquistar o primeiro lugar nos objetivos que perseguimos. É certo que tudo isso pode ajudar uma pessoa a tornar-se  requisitada e até mesmo reconhecida. Mas é o alguém que há por trás desses desejos, desses sonhos; é o alguém que conquistou o status, o diploma, a notoriedade, que é importante. 



O que fazemos pode dar uma ideia
de nossas condições.
Não do que somos. 
Não são as coisas ou conquistas que nos fazem alguém na vida. É por sermos alguém, que conquistamos. A visão contrária, torna pessoas escravas de suas buscas, como se a realização nessas esferas da realidade humana fosse o principal, um fim em si mesmo ou o que bastasse. Aprendemos a trabalhar no sentido inverso, a ponto de nos sentirmos valorizados apenas pelo que temos, não pelo alguém que somos. Aprendemos a nos sentirmos satisfeitos, apenas quando fazemos parte do grupo consumidor; dos que são aplaudidos ou ovacionados por alguma realização que agrade o seu grupo. Aprendemos a não nos contentarmos apenas com a idéia de sermos alguém como somos: Únicos; insubstituíveis. Esta parece uma visão romântica diante da praticidade que a vida que construímos nos exige. Passamos a viver a vida reagindo mais, e agindo menos. Os que tocam a música, querem que dancemos segundo seu ritmo e, dificilmente, paramos essa música para trocá-la. Perdemos o auto controle e vivemos sob controles sugeridos. Viver o sentido inverso, do que coletivamente aprendemos causa sofrimento e, dificilmente, seremos compreendidos como somos. Desta forma precisaremos sempre de uma "escora" para sustentar-nos; é uma sustentação vulnerável, insegura que, quando a perdermos, sobrará exatamente o alguém que somos e que não aprendemos a aceitar. 

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

CONSTRANGIMENTO POSITIVO?


Ela trabalhava fora. Saía cedo de casa, ainda  de madrugada, para chegar a tempo no trabalho. Enfrentava ônibus e trens lotados. Tinha dois filhos. O mais velho, de 13 anos estudava pela manhã e chegava em casa no início da tarde. O mais novo, ficava na creche-escola em período integral até a chegada da mãe. O pai trabalhava nas proximidades, numa banca de frutas e, o filho,  fazia-lhe companhia durante o restante da tarde. Mas, naquele dia, o filho chegou atrasado, diferentemente dos outros dias, como de costume, mas com um belo e reluzente relógio no pulso.  Com muita alegria, levantou o braço, aproximou o pulso do rosto, como que chamando a atenção para aquele objeto de valor. O pai, logo tratou de saber como havia conseguido aquele aquele relógio.

A educação que o menino recebia dos pais, aparentemente o instruia sobre questões morais, valores, respeito ao próximo, honestidade. O menino ficou meio sem jeito de dizer, mas falou que ganhou de uma pessoa na escola, sem dizer quem havia lhe presenteado. Mesmo sabendo que o filho era um bom menino, e confiante na educação que lhe dava,  o pai  procurou tirar a história a limpo. Disse para o filho contar a história direito, que só queria ajudá-lo e que confiasse nele. Ao chegar em casa à noite, conversou com a esposa sobre o ocorrido.
O " ralhar" precisa ter  propósito
educativo, não uma maneira de
descarregar raiva. 

Ela concordou que o caso fosse apurado, mas deveria fazer isso com muito carinho e amor, pois tratava-se de um assunto delicado e poderia causar inimizade do filho. Poderia deixar o menino constrangido, revoltado, ou até inseguro,  se ele demonstrasse desconfiança para com o filho. E foi assim que, decidido, o pai disse ao filho que iria à  escola com ele no dia seguinte e que gostaria de ser apresentado à pessoa que o presenteou, porque queria, de igual modo, em sinal de agradecimento,  presenteá-la também.

O pai, então,  preparou uma cesta de frutas frescas das quais vendia em sua banca,  e levou com ele. Ao chegar à escola, o menino apontou para uma senhora, que era conhecida como a “tia da limpeza”, dizendo ter sido ela que o presenteou com aquele relógio. Os dois se aproximaram daquela mulher. O pai do menino se dirigiu a ela perguntando se ela havia presenteado seu filho com aquele relógio. A mulher, com os olhos lacrimejantes disse ao pai daquele menino, que seu filho era um menino de ouro. E contou a história. Foi na hora do intervalo, na volta para a sala de aula: um colega havia se ferido numa brincadeira e sofreu um corte no braço e, ao ir para o banheiro lavar-se, escorregou no chão molhado e caiu. O menino o encontrou e  correu para avisar e chamar o socorro e não sossegou enquanto não recebeu a notícia de que o amigo estava bem. Depois disso, ainda ajudou a ”tia da limpeza” a limpar o local. Emocionada, ela se lembrou que seu filho também se acidentou certa vez, ficou gravemente ferido em um acidente de trânsito e, mesmo diante de tanta gente passando pelo local, ninguém o socorreu. Ele não tinha nenhum ferimento aparente e ela lembra que, por isso talvez, não tenha sido socorrido. Mas ela presenteou aquele menino, com um relógio que pertencia ao filho dela.

Essa história do menino, que levou o pai a desconfiar do objeto que estava com seu filho, levou à revelação de uma outra história. O menino foi elogiado por sua presteza e iniciativa em ajudar ao próximo. Mas, a maneira como o pai agiu diante desse episódio, demonstrou preocupação e cuidado com o filho. Esse pai, acabou descobrindo as atitudes positivas do menino longe de seus olhos. A preocupação em acompanhar cada ação, cada conquista e cada reação dos filhos, pode não significar  “controle” ou constrangimento, como muitos são tentados a pensar, por uma mentalidade moderna de educar sob o argumento de que o importante é assumir o que se faz. Lembro-me ainda nos anos 80 de um comercial de rádio, que anunciava shampoo, creme rinse e desodorante de uma marca que não se vê mais no mercado. Em uma das peças, o rapaz chegava tarde em casa, e levava aquele sermão do pai. Noutra peça, da moça que dormiu na casa do namorado.
Longe dos "portões" de casa,   a educação
recebida também se revela. 
A mensagem do comercial era de que o shampoo, o creme rinse e o desodorante daquela marca era usado “ por uma geração que assume o que faz”. Nesse caso,  “saber o que faz”, sugeria quebrar o modelo  da educação que os pais davam. Ou seja: não podia impedir aos filhos, de fazerem o que desejavam fazer, bastando apenas “assumir seus atos”.


Hoje em dia, diferentemente do passado, em que normalmente os pais inquiriam respostas, se preocupavam em saber o que os filhos faziam, onde e com quem estavam, existe um mercado tecnológico para ajudar os pais a monitorarem os filhos, sem dar a eles a chance do diálogo. Dispositivos são colocados nos computadores para "vigiar" em que sites e comunidades seus filhos estão acessando, até tornar possível saber em que teclas seus filhos digitam. Cada vez mais, isso revela o distanciamento presencial dos pais e, com os recursos tecnológicos que oferecem o monitoramento passam a viver uma falsa sensação de estar cumprindo com seu papel. Mas na verdade, o  monitoramento só revelará o que os filhos acessam, não os motivos que os levam a buscar no mundo virtual o que não conseguem obter dentro da realidade em que vivem. O monitoramento constata apenas um fato, mas não resolve seus motivos.
No caso da "geração que assume o que faz" em muitos casos, quando se chega a assumir, mesmo sob aplausos pelo reconhecimento de responsabilidade, esse “assumir” pode ser o extremo, onde nem sempre se recupera o que se perdeu. Assumir uma atitude, mesmo pagando por suas consequências é um ato egoísta, pois nem sempre o lado prejudicado é ressarcido; o que foi destruído, nem sempre pode ser recomposto.  
Educação, vai além de informar ou corrigir.

A educação forma o caráter. E isso saberemos nos momentos em que saímos dos portões de casa e ganhamos vida própria. Importar-se com os filhos, seja em que situação for, também significa cuidado e amor.